sexta-feira, 11 de julho de 2014


O Programa da Voz da América “Angola Fala Só” do dia 27 de Junho de 2014 teve como convidado o Activista de Direitos Humanos e Presidente do FORDU-Fórum Regional para o Desenvolvimento Universitário, Ângelo Kapwatcha. O tema da semana fora escolhido em função do que mais atenção chamou que foi a greve dos professores da província da Huila, que brutalmente foram reprimidos pelo Governo no lugar de ouvir seus clamores. 19 professores foram arrastados para as cadeias e uns tantos foram brutalmente espancados pela polícia opressora. O símbolo da greve era a cor preta e todos os manifestantes usaram roupa preta e por conjuntura opressora da polícia, a cidade do Lubango testemunhou algo jamais visto: todo o cidadão de qualquer ramo de trabalho se inconscientemente trajasse algo preto era confundido com grevistas e era torturado e levado para cadeia; é assim que  a envergadura da sevícia ditatorial não  poupou mulheres que amamentam nem sacerdotes. Foi na essência este tema que reflectiu o quadro actual da Educação que apesar da Reforma Educativa em fase final na República de Angola, a proposta pedagógica que a Reforma pregava não fora atingida. Nem de longe nem de perto. Os professores anseiam o fim da Reforma Educativa como o preso anseia pela liberdade. O famoso sistema de monodocência e a transição automática em certas classes, são uns entre os vários martelos que esmagam inexoravelmente a qualidade de ensino, a par de falta de materiais didácticos, escassez de bibliografia, fraca capacidade docente-educativa dos respectivos professores. Falta de plena articulação entre a escola e a comunidade onde ela está inserida, falta de perfeito equilíbrio no atendimento aos alunos. A escola inserida no contexto da Republica de Angola com todos os seus problemas, essa escola está descontextualizada e não fala a linguagem que os alunos e família entendem como a linguagem da opressão do Governo, a escola não diz aos seus alunos que em Angola há pobreza, corrupção, falta de probidade, honestidade e sabedoria por parte dos governantes. A escola fala de universo extraterrestre e por isso está desgarrada, desligada da realidade de Angola, por outras palavras em Angola a escola ensina teorias que não se adequam à prática quotidiana e é uma escola imaginária, fantasmagórica cuja missão se resume em uma: ensinar a ler, a fazer cálculos e a escrever. A escola angolana instrui mas não educa. Forma o ter conhecimentos mas não forma o ser pessoa. Agravados com salários e subsídios inadequados, sem condições laborais apropriadas, a injusta e desigual distribuição geográfica das infraestruturas escolares conclui-se, com convicção insofismável, de que a Reforma Educativa no plano pratico não aconteceu em Angola. Tudo é por culpa da tutela política que tem algemado cruelmente a tutela científica. A partidarização da educação como tudo, em Angola, leva a que o político pensa que, só por ser político, assim já é cientista e é ele semianalfabeto funcional que deve decidir o que os cientistas têm que fazer. Assim não dá! Os professores não gozam de benefícios profissionais adequados e previstos nas leis angolanas, daí as constantes reclamações cuja resposta única do governo angolano tem sido a repressão, as cadeias e a tortura. No lugar de resolver os problemas o Governo abafa as reclamações com polícia cruel. Ao invés de dialogar e negociar os Termos, o Governo só acredita num único caminho, que é a metralhadora. Isto não é uma ordem natural! Isso é apanágio da relação entre o Escravo e o Patrão! Ao longo do programa “Angola Fala Só”, o diálogo com os ouvintes embora tivesse como foco fundamental da semana a Educação e sua qualidade, o interesse dos ouvintes foi mais para as questões inerentes a Exclusão Social, a Violação dos Direitos Humanos e a discriminação dos antigos combatentes e veteranos da pátria que se encontram empobrecidas e abandonadas pelo Governo ao arrepio da riqueza infinita que seus generais antigos chefes ostentam nos quatro cantos do globo.

1-Senhor António do Kwanza-Sul perguntou: Quando é que a Exclusão social na Educação e na Saúde irá acabar em Angola?

Ângelo Kapwatcha respondeu: o Ensino primário angolano é gratuito e obrigatório e os cuidados primários de saúde também são gratuitos o que significa que a matriz dos serviços sociais de base, seria a inclusão social. Porém, na maior parte das instituições sociais a exclusão é desenhada de forma subliminar na estrutura altamente hierarquizada no favoritismo baseado na filiação partidária. Devido a excessiva partidarização das instituições do Estado bem como noutros preconceitos de caracter político vemos que a educação sem qualidade e saúde sem qualidade sobram sempre para os pobres sobretudo os das zonas rurais e aqueles que não prostram de joelho diante das pressões políticas do Governo. Mas, observando mais de perto é fácil notar que a matriz governativa do Estado Angolano se baseia na exclusão, para forçar a obediência, a dependência e por esta via desencorajar a autonomia e a liberdade de escolha. Os Orçamentos Gerais do Estado são o exemplo instrumental mais eloquente: mais de 80% do OGE fica em Luanda dividido entre a Província de Luanda e a estrutura Central do Estado, ficando mais ou menos 20% ou menos para as restantes 17 províncias, e seus municípios e comunas. Essas províncias altamente penalizadas pelos OGE’s não conseguem criar empregos de qualidade, não possuem indústria, nem melhores serviços sociais. Por conseguinte, os cidadãos que vivem nas zonas onde os OGE’s são baixos seus cidadãos são relativamente mais pobres, mais analfabetos, têm maior dificuldade de acesso aos serviços sociais e bens culturais sobretudo ensino superior. Para conseguir visibilidade e atingir algum sonho tem que imigrar sazonalmente para províncias mais favorecidas como Luanda ou Benguela. Exemplificando esse fosso está Luanda num extremo de prosperidade, existem universidades, acesso fáceis a bens industriais, mídia mais plural, museus e zonas de lazeres, supermercados acessíveis e opções económicas informais mais vantajosos, infraestruturas modernas e com esses meios fica fácil o acesso a riqueza para seus cidadãos mesmo sem apoio direcionado do Governo. E no extremo oposto está por exemplo o Cuando-Cubango onde na capital da província (Menongue) não possui nem 0,2 % das infraestruturas que tem um subúrbio de Luanda como Benfica. O mesmo se pode dizer entre a província de Benguela e seu centro industrial e económico do Lobito em relação à província pobre como Moxico e ou Cunene, até perante um simples cidadão do Lobito ao cruzar com um Governador do Moxico este fica cabisbaixo porque sua governação significa Nada! Todas essas assimetrias regionais provinciais, visam destruir o princípio constitucional de igualdade entre as regiões angolanas do litoral e relação ao interior estendendo essa igualdade de cidadãos nos termos do artigo 23º da Constituição da República de Angola. Tudo isto entra no conceito de exclusão social. Só assim é que se explica que as províncias mais fustigadas pelo conflito armado no passado como Huambo, Bié, Malange, Uíge, Lundas, Cuando-Cubango, Moxico, até hoje não possuem fábrica de materiais de construção de que mais necessidades têm. Não possuem indústrias transformadoras de bens alimentares, não possuem transportes fluidos que sejam públicos, não possuem esperança de um dia melhor e a vida se tornou numa rotina onde as pessoas já sabem de forma cristalizada “hoje” o que vai “amanhã”.

2-O Senhor Massango, do Kuando-Kubango perguntou: Em Angola o Governo através da polícia mata os cidadãos. A juventude não tem rumo devido a pobreza, o álcool e outros vícios. A comunidade internacional não ajuda. Então onde é que estão os Direitos Humanos em Angola?

Ângelo Kapwatcha respondeu: O senhor que fala a partir do Kuando-Kubango, levantou um tema que não está muito enquadrado no tema de Educação que essencialmente estamos a abordar. Mas este tema tem uma pertinência fundamental pelo facto de isto se ligar directamente ao meu próprio trabalho. Na qualidade de Activista de Direitos Humanos, me agrada respondê-lo. Falou, se entendi bem de 3 aspetos fundamentais:

1º- Referiu que o Estado angolano não respeita a vida e no quadro de Direitos Humanos dever-se-ia respeitar a vida humana.

2º- Falou dos alicerces primordiais de formação de uma juventude orientada para o amanhã.

3º- E finalmente tratou da contribuição que deveria dar, eventualmente, a comunidade internacional, na garantia dos Direitos Humanos na República de Angola.

Direitos Humanos em Angola é um problema muito grave. Embora tenhamos as instituições de protecção jurisdicional como os Tribunais, o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, a Secretaria de Estado para os Direitos Humanos, a Provedoria da Justiça, o Parlamento. As entidades operacionais de garantias e satisfação dos Direitos Humanos como a polícia…Não obstante verificamos que em Angola temos milhares de problemas de Direitos Humanos. A maior parte desses Direitos são violados como falta de vontade política de garantir, proteger e sobretudo satisfazer os direitos dos cidadãos, que vão desde os direitos económicos cuja violação está evidenciada na pobreza da maioria esmagadora da população ao lado de uma classe política governante opulenta ao lado de um povo que morre à fome; as pessoas morrem em hospitais por falta de medicamentos e cuidados adequados, violando seus direitos sociais. Em Angola as casas são demolidas sem recompensas violando os direitos a habitação que é um direito fundamental. Os delinquentes matam pessoas, e roubam outras, por falta de segurança pública que também é um direito que no lugar de a polícia garantir a segurança pública se furta de trabalho a sério e lega o cidadão à vulnerabilidade. A polícia trânsito altamente venal e corrupta põe em risco o conceito de livre circulação de pessoas e bens que é um direito conquistado com sacrifícios indizíveis. Os serviços de migração e estrangeira sórdidas e subornáveis colocam em risco a segurança de estado ao permitir a entrada ilegal de estrangeiros e com eles as práticas culturais estranhas, negócios escuros, moralidade duvidosa, credos sombrios, origens promíscuos etc. Verificamos as perigosidades que correm os activistas de Direitos Humanos, os Jornalistas Livres, os Intelectuais Livres, os membros de partidos da oposição mais acutilantes por perseguições instruídas pelo Governo e que das mortes e torturas de activistas e políticos o Governo é o único beneficiário do nosso sofrimento. E acima de tudo existem torturas nas cadeias contra os presos, que deveriam apenas viverem a punição de supressão de liberdade e como se não bastasse viver nas grades deterioradas ainda são maltratados pelos agentes carcerários ao arrepio da lei de protecção dos direitos dos detidos e condenados. Temos casos recentes de activistas mortos pelos agentes da Segurança do Estado que no lugar de serem severa e exemplarmente punidos penso que foram promovidos com altas condecorações, com grandes medalhas e honras sublimes por matarem cidadãos que só querem livremente se exprimirem ao abrigo da Lei Angolana. Os exemplos são pungentes em Angola e isentam quaisquer citações uma vez que todos o sabemos. Mas o meu amigo Massango, do Cuando-Cubango, devo lembrá-lo que a Constituição de Angola tem os artigos 47º, 73 º e 74º da Constituição de Angola oferecem uma prerrogativa, um privilégio fundamental ao cidadão, quando bem usados e aproveitados com coragem, determinação e arrojo de o cidadão, se reunir, se manifestar, reclamar, denunciar, queixar, tomar iniciativa popular se os seus direitos forem violados. Muitas vezes os angolanos sofrem em silêncio; é preciso que os cidadãos se unam e se encontrem, cruzem pensamentos e ideias, alterem as crenças, duvidem de vãs promessas, não aceitem serem traídos com beijos e sorrisos de cães que mordem. Não podem aceitar ser violentadas pelas Instituições do Estado porque pela vocação ontológica, a razão de existência do Estado é o Bem-Estar do povo, a Justiça Social e Distributiva, e a Segurança deste mesmo povo. As Instituições do Estado existem para proteger direitos e não para coarctar esses mesmos direitos. Afigura-se contraproducente se for este mesmo Estado que no lugar de garantir a segurança das pessoas, de satisfazer os direitos das pessoas, seja ele mesmo o Estado a violar tais direitos. Ora, nós em Angola temos este problema de défice de garantia. As Instituições do Estado não só não têm-se mostrado Capazes de reconhecer, garantir e satisfazer os direitos fundamentais dos cidadãos, aqueles sem os quais o cidadão não vive e tem imensas dificuldades de sobreviver tais como a vida, alimentação, saúde, habitação, emprego, etc como tem sido típico em Angola serem as próprias Instituições do Estado engajadas a violar tais direitos dos cidadãos. O Estado tem sido o protagonista quase único da destruição da felicidade e prosperidade dos cidadãos Angolanos. Se eu disser que em Angola não temos o Estado para o Bem mas sim para destruir o conceito do Povo e da Cidadania, não estarei muito errado. Todas essas violações que narrei há instantes, têm muito que ver com a complexidade funcional do próprio Estado: quando o Estado não garante estes direitos o povo está desprotegido. Aí o povo tem que voltar para dentro de si e reinventar o conceito de cidadania mais acutilante, mais actuante, mais reivindicativo, mais exigente. Porque mesmo as ditaduras se robustecem com a passividade do povo. “Não haveria nenhum Opressor Forte se não contasse com a cooperação cúmplice de muitos oprimidos.” Na perspectiva dos direitos fundamentais é urgente fazermos reformas políticas em Angola como aconteceu na África do Sul em 1994 com Nelson Mandela que pós fim o apartheid ou como aconteceu a Norte de África com o fim da ditadura de Muammar Kadhaffi e Bem Alli em 2011. É o povo que deve ditar o estilo e o ritmo do fim da ditadura em Angola.

Relativamente ao apoio que os angolanos devem esperar da comunidade internacional para garantir os Direitos Humanos, nós em Angola temos muitos mecanismos de articulação quer com as Nações Unidas através do RPU (Revisão Periódica Universal) quer com a Comissão Africana dos Direitos Humanos da OUA. Enquanto organizações da sociedade civil, nós possuímos várias Organizações Não Governamentais que têm estatuto de Observadores dos Direitos Humanos; periodicamente temos elaborado relatórios sombras para o Comité de Direitos Humanos das Nações Unidas, a fim de lhes colocar a par das coisas que acontecem em Angola na relação de poder entre o Estado e os Cidadãos. A 55ª Sessão Ordinária da Comissão dos Direitos Humanos da OUA teve lugar em Angola, onde se realizou durante a primeira semana de Maio deste ano, de forma estranha e cínica, no decorrer dessa Sessão eu, pessoalmente, denunciei várias irregularidades: à revelia da Comunidade Internacional, o Governo torturou os jovens que tentaram uma manifestação pacífica na zona da Estalagem em Luanda, ao passo que as vendedeiras ambulantes estavam a ser torturadas e roubadas pelos fiscais de Luanda,  na zona do mercado dos Congolenses mais propriamente na passagem superior que dá para o CIMEX etc. A comunidade Internacional tem se centrado muito nas questões formais, através de incentivar o Estado Angolano a ractificar tratados internacionais que na prática nunca cumpre. A título de exemplo, em Setembro de 2013, o Estado Angolano, através do Ministro de Relações Exteriores ractificou os Tratados Internacionais onde o mesmo Estado se compromete a colocar fim nas torturas e contra a pena de morte bem como contra outras formas degradantes. No mesmo mês enquanto se ractificava tratados internacionais em Nova Iorque, em Luanda o mesmo Estado angolano colocou na cadeia com torturas inclassificáveis, o menor Nito Alves, a PGR acabava de informar à Nação de que o SINSE-Serviços de Inteligência e Segurança de Estado mataram barbaramente 2 activistas cujos corpos foram jogados aos jacarés e até hoje a ONU não disse absolutamente nada. Na mesma sequência de práticas hediondas, o Estado Angolano mandou a polícia no dia 05 de Dezembro de 2013 a bombardear a cadeia central de Luanda matando 15 presos e ferindo outros 53 detidos e condenados por reclamar direito à visitas no natal. A ONU não disse nada. Dia 23 de Novembro de 2013 o Guarda do Presidente da República matou a queima-roupa o membro da coligação CASA-CE  Wilberto Ganga e até hoje  estamos a espera que a ONU diga algo e obviamente não dirá absolutamente nada. Porque é que a ONU não diz nada? A resposta é: isto não é com eles mas sim connosco, o povo. Temos que nos unir e resolvermos este assunto definitivamente…É por aí que devemos fazer a leitura do tipo de comunidade internacional que temos em relação ao comportamento do Estado Angolano. Na República de Angola, mensalmente morre alguém ou por negligência das instituições do Estado, ou a mando do Governo. Mas infelizmente, eu na minha qualidade de Activista dos Direitos Humanos, tenho denunciado que a comunidade internacional no plano prático tem operado muito pouco ou nada a favor do povo angolano. Todavia, isto tem muito a ver com os próprios factores conjunturais de cooperação. Porque não existe a nível internacional qualquer mecanismo supraestadual de punição, ou seja, não existe uma estrutura acima do Estado que possa aplicar grandes medidas sancionatórias contra um Estado, de que os Estados soberanos possam temer. É assim que os Estados, Soberanos como Angola, abusam dos direitos fundamentais de seus cidadãos, com argumento escapatório de que estão a exercer a sua soberania. Por medo de ingerência nos assuntos internos, e no afã de preservar os acordos e garantias económicas, a comunidade internacional, aliás, a sociedade internacional, porque eu tenho-me posicionado que, nós a nível do mundo não alcançamos ainda a comunidade internacional; o que temos é uma sociedade internacional porque aquela baseia sua actuação na solidariedade, na justiça, no cosmopolitismo inclusivo, no bem comum, na paz social, ao passo que a sociedade internacional tem como premissa fundamental os seus interesses. Então se o que estiver em jogo for o acesso às matérias-primas sobretudo os famosos recursos energéticos, a sociedade internacional não vê de onde vem a diferença entre matar um povo com miséria e perseguições ou conduzir os negócios lucrativos mesmo que sejam negócios de sangue. É assim que no caso angolano, para a sociedade internacional preservar seus interesses prefere manter o silêncio diante das arbitrariedades do Estado angolano contra o povo indefeso, desprovido e desterrado de suas próprias terras, casas e Pátria.  Exceptuando a Amnistia Internacional e a Human Wright Watch que tudo têm feito para denunciar abusos contra os direitos dos cidadãos em Angola,  todas as Organizações Intergovernamentais e as próprias agências da ONU têm mantido um silêncio conivente diante do sofrimento clamoroso do povo angolano.

3-Sr. Alcides Do Huambo perguntou: Onde estão e o que fazem as organizações de defesa dos Direitos Humanos em Angola? E qual tem sido a reacção do Estado Angolano?

Ângelo Kapwatcha responde: A prática consuetudinária do Estado angolano é uma repulsa à matéria de protecção dos Direitos Humanos. O Estado Angolano tem uma aversão negativa dos Direitos Humanos e tem na violência, na repressão, na injustiça, na discriminação, na exclusão social, o seu padrão de Governação, o seu standard governativo. Isto não é uma ordem natural. É inumano, desprezível e perigoso. Por extensão do Estado à cultura de cidadania; o imperativo ideológico-político do Estado angolano fez de seus cidadãos um universo súbdito de população. Orientada à obediência doentia, de que o Estado se colocou na posição de um Pastor gigantesco que pasta uma manada de ovelhas cegas, e paternalisticamente são conduzidos aos vales verdejantes ao ritmo e capricho do pastor. Essa relação de poder entre o Estado e o Cidadão traduzida na relação entre o Cego e o seu Guia, produziu uma timidez muito grande de os cidadãos reivindicarem seus direitos fundantes. Para a manutenção dessa relação passiva, amorfa e subserviente entre o Estado totalitário e o povo reduzido a população inerte, o Estado desenvolveu a “indústria do medo” para tornar o povo permanentemente assustado, inseguro, triste, desesperado, consumista, afogando suas esperanças nos prazeres fúteis, supérfluos, basicamente carnais imediatas porque o povo entende que viver mais um dia numa masmorra social é uma questão de sorte; então “O nosso pão de cada dia nos dai hoje”; porque o amanhã não nos pertence. É isto que está a trazer alcoolismo, prostituições, consumos supérfluos, imediatismo, sobrevivência de mais um dia…

Conquanto tivéssemos em Angola Organizações, Associações, ONG’s, que defendem os Direitos Humanos, os seus espaços de articulação são minados pela desestabilização económica, produzidas pelo próprio Estado para que essas organizações não sejam nem eficazes nem eficientes. A ineficácia e ineficiências das organizações de defesa dos Direitos Humanos fertilizam a violência perpetrada pelo Estado e assim o povo fica vulnerável e na vulnerabilidade vê no Estado opressor ainda o Redentor. Parece estranho! Em Angola está a se passar um fenómeno espetacularmente subversivo, contundente e lamentável contra as Organizações da Sociedade Civil efetivamente defensoras dos Direitos Humanos: como defender Direitos Humanos é se colocar contra o Estado; então desde que terminou a guerra militar o Estado definiu, identificou novos inimigos a abater: os defensores de Direitos Humanos e suas organizações principalmente a famosa “fórmula de ouro” de Angola: a neutralização dos líderes ou matando-os ou corrompendo-os para tornar ineficazes suas organizações como bem o escreve o Robert Greene no seu livro: As 48 Leis do Poder na Lei nº 42 “ ataque os pastores e as ovelhas se dispersarão”. Agora são as ONG’s que lutam para pressionar o Estado a reconhecer os Direitos dos Cidadãos. Também isto não é típico dos Estados. As denúncias que as ONG’s fazem sobre violação de Direitos Humanos resultam em perseguições, mortes, chantagens económicas, etc. a maior parte das Organizações Internacionais que apoiavam iniciativas de defesa dos Direitos Humanos, o Estado angolano está a levar uma campanha subtil e eficaz de chantagens cujos esquadrões são os corpos diplomáticos angolanos, os serviços de inteligências e a SONANGOL em pressionar as Instituições Internacionais em deixar de financiar as ONG’s de Direitos Humanos em troca de acordos de exploração de petróleo e outras vantagens comerciais. Nenhuma corporação transnacional que opera em Angola no sector de petróleo, financia Direitos Humanos e Democracia, mesmo aquelas empresas que vieram de Países que se arrogam serem donos da Democracia, Senhores dos Direitos Humanos, mas aqui em Angola fizeram o pacto com o Diabo estigmatizando os defensores de Direitos Humanos e suas Organizações. Porém, essas empresas transnacionais não hesitam e disponibilizar fundos para financiar amplamente a distribuição de preservativos e redes mosquiteiros; que são boa coisa também, só que onde há violação de Direitos Humanos, seria prioritário defender os Direitos Humanos no lugar de oferecer um preservativo ou um mosquiteiro. Pronto eles são livres e conhecem suas razões e suas prioridades. Assim, embora nominalmente existam várias organizações de defesa dos Direitos Humanos, na prática nem chegam 10 ONG’s actuantes. A Chantagem económica tem levado ao fecho dessas Organizações e como consequência imediata os povos desprotegidos veem crescer sua vulnerabilidade diante de um Estado que lhes tortura, lhes arrebanha, lhes empobrece, lhes rouba, lhes corrompe, numa palavra, lhes mata. É assim que as nossas vozes corajosas agora clamam no deserto de um total isolamento. São poucas as pessoas e organizações interessadas em defender Direitos dos cidadãos porque o risco cresce na vertical e na horizontal. Pelo menos, felizmente, nós estamos motivados e animados a levar a batalha até a víctoria final, à qual pertence aos que nela acreditam. Aliás, o poeta diz que “ há sol, bastante no horizonte; podemos avançar sem medo da escuridão”.

4-Senhor Mukundi da Lunda-Norte pergunta comentando. Nós antigos combatentes estamos a sofrer muito. Estamos pobres e o Governo não nos ajuda e a solução para nós é voltar a sacrificar o País, podemos voltar a pegar em armas para lutar contra este governo que nos abandonou.

Ângelo Kapwatcha responde: Começaria por dizer que esta preocupação do amigo Mukundi, na Lunda-Norte se enquadra na pergunta do amigo António do Kwanza-Sul que perguntava para quando o fim da exclusão social. A resposta é quase a mesma. O Governo Angolano no plano teórico tem tido programas e projectos muito bons. Brilhantes até. Porém, transferindo-os para o plano mais prático, 90% desses programas e projectos do Estado Angolano fracassam antes de completar 2 anos de sua implementação. Primeiro por causa dos problemas conjunturais de Angola que o Governo não tem vontade política de resolver como por exemplo o combate a corrupção, falta de transparência, a despartidarização das instituições públicas, a implementação cabal do princípio de igualdade entre os cidadãos angolanos e as regiões angolanas, o principio de separação de poderes e funções, o acesso equitativo à justiça, a implementação da justiça distributiva sobretudo dos meios e empregos para o combate a pobreza. A exclusão económica, a exclusão social, a débil integração de todos os antigos combatentes e veteranos de guerra nas estruturas económicas quer através de mecanismos imparciais de combate a pobreza, quer através de incentivos à profissionalização quer ainda através doutros mecanismos de subsídios e pensões de que os antigos combatentes têm direito. Ora, todos os Acordos de Paz e os subsequentes protocolos como o de Lusaka e Memorandum do Luena, previam uma correcta integração dos antigos militares em várias instituições quer paramilitares como Polícia Nacional quer para as esferas de exército único como nas FAA, assim como aqueles não reintegrados nestas esferas poderiam beneficiar de pensões e subsídios assistidos de outros incentivos e pacotes visando uma reintegração equilibrada na sociedade civil. Do lado da UNITA houve as FALA que não estão plenamente satisfeitos do ponto de vista da sua reintegração socioeconómica. Do lado do governo eram as FAPLA, a BPV, a ODP, a Defesa Civil, a Segurança de Estado, milhares e milhares desfilam nas ruas nus, desnutridos, rotos e piolhentos, bêbados, sem qualquer tipo de apoio por parte do Estado. Alguns foram acolhidos pelo ramo de esmola e mendicidade. Outros, o álcool e a droga estão a tomar conta deles. Ainda alguns vivem de pequenos e grandes roubos quer nas lavras de camponeses quer nos centros urbanos como Luanda ,  Benguela, Huambo e  outras cidades. Existem antigos militares que passam o dia a tremer no chão como possessos porque enlouqueceram devido ao abandono e a pobreza abjecta que tecnicamente o Governo desenhara no Gabinete e distribuiu mais e melhor. Isto também não é uma ordem natural: o Governo sempre promete distribuir mais e melhor a riqueza de Angola e na prática distribui mais e melhor a miséria e as mortes dos cidadãos. Porém saudamos o facto de que existem ex-militares que já estão a se beneficiar de suas pensões porém tais não abrangeram todos os antigos combatentes, porque alguns não possuem identidade documental de que tenham sido militares no passado e aí deve igualmente haver esforço do Governo mesmo que exija desmobilizá-los novamente. O Senhor que falava a partir da Lunda-Norte ameaçou que iriam recorrer novamente à guerra se o Estado não resolver seu problema. Eu, pessoalmente, saúdo esta ameaça. Porque serve de chamada de atenção ao Estado que já seria a hora de o mesmo Estado saber que a sua empresa de exclusão social pode levar a extremar posições entre eles e o povo que se sente injustiçado, descontente e marginalizado tais como os antigos militares. Mas o apelo que se deve fazer ao Estado é a integração total sem discriminação. O descontentamento faz sentido. Mas nós em Angola somos um Estado de Direito, qualquer tipo de atitude deve ter o primado da Lei. Recorrer às instâncias legais por meios igualmente legais, contactando os deputados no Parlamento, contactando o Ministério da Defesa, contactando o Ministério dos Antigos Combatentes, contactando os activistas de Direitos Humanos para fazerem advocacia social a favor dos antigos combatentes e veteranos da pátria. Se se esgotar os recursos legais através de reclamações, queixas e reivindicações legais. Então o segundo passo deve ser as manifestações também legalmente previstas e protegidas nos termos quer da Constituição quer doutras leis avulsas. O Estado angolano tem hábito de raptar manifestantes pacíficos e matá-los. Mas, o Estado não irá conseguir matar todos os angolanos se saírem à rua porque fica cansado, os angolanos todos são em número maior do que a polícia e as FAA. O Estado angolano tem hábito de colocar na cadeia e espancar manifestantes, mas o Estado não será capaz de espancar todos os angolanos e não tem cadeias que possam albergar todos os angolanos se duma vez só saírem a rua 15 milhões de angolanos tal como o povo tem saído em massa para ir votar em eleições cujo troco são perseguições, mortes, roubo da coisa pública. O povo deve solidarizar-se e unir-se aos clamores dos empobrecidos antigos combatentes e veteranos de guerra dinamizando eventos de desobediência civil que é uma resistência passiva e pacífica por vários dias, sacrifícios, suportando sede e fome nas ruas por semanas como os heróis anónimos da empresa ANGONAVE que acabaram morrendo em greve perpétuo na Baixa de Luanda. O Estado não será capaz de matar todo o povo porque já tentou ao longo da história fazê-lo e sobre vários métodos e técnicas e não conseguiu. Quem tiver dúvida que pergunte o povo do Huambo e Bié como é que o Estado tentou os eliminar com bombardeamentos venenosos, claro que não conseguiu. Já houve iniciativas de manifestações em 2011, 2012, 2013. Deve se usar direitos como a manifestação. Ao invés de recorrer à guerra seria aconselhável recorrer às manifestações. Porque a guerra é feia. É muito mais feia do que a pobreza. Porque só numa grande pobreza os desfavorecidos morrem. Mas na guerra os desfavorecidos são usados como carne de canhão. A guerra deve ser abordada com muita prudência assim como as revoluções. Partindo do facto de que os antigos militares não são accionistas de bancos nem de grandes empresas de telecomunicações, os antigos combatentes, filhos de camponeses, não são detentores de direitos de explorações de alguns canais da televisão ou grandes empresas de comunicações, os antigos combatentes não são nem accionistas de empresas de petróleo nem são gestores de fundos soberanos de Angola. Não possuem barcos, não possuem fábricas, não possuem colégios e universidades ou clínicas, não possuem aeroportos e aviões. Só isto seria o suficiente para se acreditar que numa guerra provável, o pobre não tem nada a perder, por isso pode lutar com bravura e geralmente ganha, o pobre só não ganha a guerra, só não vence os ricos e os ditadores se no mesmo meio dos pobres houver traidores que boicotam a luta e negoceiam com o Diabo. Os antigos combatentes e o povo em geral não têm riqueza para proteger, não têm reputação que o precede, não têm grande esperança e a sua esperança e sua sorte residem numa possível derrota da ditadura e instauração de nova ordem, que talvez possa redefinir a justiça na distribuição da riqueza e punir os culpados da actual situação. Mas por vezes as coisas fogem do controlo. Hoje por hoje, os ex-militares são a franja da sociedade angolana mais empobrecida; pelo contrário os generais, ostentam riquezas sem precedente, são prepotentes e egoístas. Esqueceram totalmente aqueles que lutaram e os ajudaram a chegar lá.  A sua riqueza representa de facto o símbolo da miséria dos antigos militares que os serviu. Ou seja, os Generais vivem opulentos à custa do sofrimento de seus antigos soldados. Neste ponto de vista a guerra é boa, porque só na guerra é que se forma generais. Ninguém conseguiu atingir a patente de general, ou de brigadeiro ou mesmo de coronel só porque vendeu gelo ou água fresca. Apenas atingiram este nível porque participaram com coragem numa guerra. O Governo angolano aprecia intimidar a Nação inteira vendendo a paz dele para incutir na população o medo de guerra. Do que eu saiba, quem começou a guerra foi sempre o Governo e nunca o povo. Aliás, nenhum camponês viajou de Malanje, ou do Uíge ou do Cunene ou do Moxico a ir para URSS ou Cuba  comprar armamento tal como tanques de guerra, aviões de guerra e vir em Angola lutar. A guerra foi desenhada como negócio do Governo e deu seus lucros, quem quer saber desses lucros que Pergunte o empresário Pierre Falcone e que dos lucros de guerra lhe valei até a nacionalidade angolana e um passaporte diplomático, que deliciosa guerra! E agora o Governo angolano quer vender a desolação a que chama Paz, como seu negócio igualmente lucrativo. Claro que numa paz injusta e numa guerra injusta, o povo fica sempre com a pior parte. Ficando com a pior parte, então não tem nada a temer. Porque tanto a paz como a guerra, para o povo significa sofrimento. Eu gostaria de aconselhar guerra ou paz. Eu apreciaria aconselhar greves ou manifestações nas ruas. Eu gostaria de aconselhar desobediência civil generalizada ou guerrilhas urbanas de toda a espécie. Mas isso, seria inútil para um povo angolano que suponho deve saber o que quer. O povo é soberano. A Constituição de Angola no seu artigo 3º diz que a Soberania Una e Indivisível reside no povo que a realiza através de várias formas. No conceito jurídico de várias formas de exercer sua soberania, o povo não se exclui a hipótese de guerras, guerrilhas, revoluções, golpes, manifestações, eleições, referendos, desobediências civis, liberdade de expressão…se o Estado angolano continuar a tratar os angolanos como escravos, como tem sido, o ingrediente único que se exigem numa luta de libertação de nova colonização é a união de todos os angolanos nas 18 províncias, nos 164 municípios, nas 557 comunas nas aldeias, nos bairros a dizer Basta! Não faltarão líderes justos, honestos, transparentes, angolanos na carne, na alma, no espírito e nos sentimentos, não faltarão instituições políticas puras e suaves. Ninguém teme a guerra. Sem a guerra não haveria civilizações modernas. A guerra é a mãe de todas as invenções. Ninguém tem medo de morrer porque a qualquer altura a morte irá contactar todas as pessoas; porque, ainda no mundo conhecido, nunca ninguém viveu até 150 anos de idade. Quando chega o momento de morte mesmo os reis não mais terão guarda-costas e polícia de intervenção rápida. Ninguém terá mais cães e cavalos ao seu serviço. No reino da morte, ninguém é chamado S. EXCELÊNCIA e todos possuem um único nome e quase todos ficam parecidos, por isso ninguém deve temer absolutamente nada. Então, o povo precisa acordar desse sono doentio, porque amanhã é um dia melhor do que hoje.

Por: Ângelo Kapwatcha

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