Enquadramento Global:
Contribuição do FORDU na Educação de adultos como exercício de direitos dos
povos.
EXPERIENCIA E VISÃO DO FORDU
NO QUADRO DA ALFABETIZAÇÃO COM METODOLOGIAS MODERNAS EM ANGOLA
1. Analise das metodologias de
alfabetização existentes em Angola
O
processo de alfabetização angolana foi desencadeado em 1978 dois anos depois da
Independência. Enquadrada no contexto do momento, a alfabetização estava
ancorada nas prioridades políticas de então. O seu currículo visava
sensibilizar, através da alfabetização, o povo a aceitar o modelo
politico-ideológico de opção marxista-leninista de então, cujo lema era “O professor é o combatente da linha da
frente, para acabar com obscurantismo e criar um homem novo”. A metodologia
era expositiva, catequética e
memorística de carácter tradicional. Depreendido do método adoptado,
conforme o seu lema, o centro de ensino, de processo e de liderança é o próprio
professor, que prepara os conteúdos para os alunos obedientes, mansos e
silenciosos estes alunos escutam atentamente a exposição (método expositivo) do
professor que discursa sem ser interrompido. Os alunos recitando os trechos dos
livros repetindo o que lê o professor, produzindo eco na sua memória-gravador
(método catequético) e materialmente ruminam as palavras e gravam-nas em
memória para depois manifestar aprendizagem gravada de forma acrítica e muitas
vezes sem compreender.
1.1-Locais, conteúdos e sistema de aprendizagem
A
Alfabetização era de carácter itinerante. Os soldados eram ensinados em seus
locais de concentração (quartéis) os agentes da polícia eram ensinados nas
esquadras. O conteúdo era fundamentalmente a educação politica inserida nos
manuais de leituras (apenas em língua portuguesa) e nas ciências integradas que
permitia que a educação colonial fosse substituída pela educação patriótica,
substituindo os nomes e termos do colono por nomes e termos nacionais e
sobretudo dos heróis da luta contra o colono e das figuras do comunismo
internacional. Manifestamente aprendia-se o código de leitura, de escrita e de
cálculo aritmético, desligado do contexto e da realidade onde se processava a
educação.
1.2-Sistemas de avaliação
A
avaliação se baseou no grau de assimilação das palavras (memorizadas) e
reproduzidas materialmente através de provas escritas. O aluno não estudava
para aprender, mas sim para aprovar. Todo o ano lectivo é transformado em
ritual de esperar o exame. A pauta se torna uma espécie de céu, ou inferno ou
purgatório. Assim todo o estudo tem por meta última a pauta do exame escrito. Então
concebia de forma rudimentar um guia de estudo com perguntas de provas
simuladas e da memória preenchia as respostas materiais em forma de lacunas.
Terminado o ciclo de provas, os conteúdos ficam abandonados e esquecidos. É
assim que mais da metade das pessoas alfabetizadas depois da independência
voltaram ao analfabetismo depois de alguns anos sem exercitar a
memória-gravador
2. Analise dos currículos que suportam a educação
Devido
a multiplicidade de línguas e etnias em Angola, e para que a escola vivenciasse
o contexto do aluno, do professor e da família, teria que adotar o currículo
nacional. Porém, em Angola, devido aos imperativos políticos de construção de
consenso de Nação, usa-se o currículo oficial, aquele adotado pelo Estado como
aqui os caracterizamos
:
:
CURRICULUM NACIONAL
|
CURRICULUM OFICIAL
|
Assegurar
o acesso de todos os alunos aos
conteúdos amplos e equilibrados para um desenvolvimento flexível e
adaptado à mudança rápida;
|
Representa
as preferências e os valores dos grupos sociais dominantes
|
Estabelecer
objectivos da sua educação obrigatória e acessível a todos os alunos,
quaisquer que sejam as suas capacidades;
|
Não
respeita o pluralismo cultural apanágio das sociedades democráticas modernas
nem a realidade da comunidade onde a escola está
|
Assegura
que todos os alunos independentemente das suas origens étnicas, sexo, local
de residência e outras características individuais e sociais, possam seguir
um currículo basicamente similar, relevante, vinculado à experiencia pessoal
e valiosa para a vida adulta;
|
Centralização
e burocratização das decisões educativas que se afastam das necessidades reais
dos alunos e da comunidade escolar no seu todo (a escola não fala a língua
dos alunos)
|
Assegurar
a progressão, a coerência, e a continuidade no decorrer da educação
obrigatória
|
Opõe-se
ao direito dos alunos seleccionarem actividades e conteúdos de aprendizagem
de acordo com as suas motivações e interesses
|
Assegurar
que os currículos ministrados em todos os estabelecimentos de ensino possuam
elementos comuns suficientes para permitir que os alunos mudem de
estabelecimento de ensino sem sofrerem desajustes desnecessários
|
Determina
o que todos os alunos devem aprender sem distinção sem ter em conta a
diversidade de capacidades, interesses e motivações dos alunos
|
Avalia o progresso realizado pelos alunos
nos sucessivos níveis de escolaridade obrigatória com o fim de exigir mais
aos que podem avançar mais e proporcionar mais ajuda pedagógica aos que dela
necessitam.
|
Anula
a autonomia e a iniciativa profissional dos docentes, que se convertem em
simples executores de um plano previamente estabelecido
|
A
educação finca raízes na vivência, nos usos, nos costumes, nas necessidades,
nas expectativas dos alunos e famílias. A educação se baseia nas causas dos
problemas em todos os sentidos e constrói caminhos e meios para os erradicar.
|
A
educação se torna um facto de exclusão social, um factor de alienação
cultural e um factor de definição de estrutura de classes.
|
3.
Analise das metodologias alternativas de
alfabetização em Angola
3.1-Programa
de alfabetização melhor adequado à realidade da comunidade.
Os
dados provisórios do último senso (2014) revelam que angola tem aproximadamente
24 milhões e 700 mil habitantes. Dessa população, 56% vive na zona urbana e 44%
nas zonas rurais. 50% Tem menos de 15 anos de idade e 60% menos de 18 anos de
idade. 53% são mulheres. Os dados
oficiais apontam para 51% de Angolanos analfabetos. Porém, a nível das zonas
rurais e do interior do País 69% São analfabetos e quase 80% são analfabetos
funcionais. Dessa cifra 77% são mulheres.
Está em curso em Angola várias pequeninas iniciativas das igrejas e ONG’s
na alfabetização com destaque para uma Associação de Ensino de Adulto de Angola
(AEAA) que apenas actua numa província do Kwanza-Sul que fica em 3 horas de
Luanda. A DW (Development Workshop) possuía um programa de alfabetização que
fechou por falta de financiamento, na província do Huambo. A PROMAICA-Promoção
da Mulher na Igreja Católica, possui igualmente um programa de alfabetização no
Bié. Existem iniciativas dispersas, esporádicas sem certificação. Essas são
dinamizadas por redes de ONG’s pequenas, cujo impacto é quase invisível no
geral.
Em Angola através do Governo, tutelado pelo Ministério da Educação,
existe o programa de abrangência total do território angolano: este projecto
chama-se PAAE-PROGRAMA DE ALFABETIZAÇÃO E ACELERAÇÃO ESCOLAR. É implementado
nas 18 províncias, nos 166 municípios mas não atingiu todas as 557 comunas de
Angola. Este programa tem contribuído desde 2009 a diminuir o índice de
analfabetismo.
A nível de todo o País
estão concebidos três módulos:
1º Módulo está destinado para a
primeira e segundas classes
2º Módulo está destinado para terceira
e quarta classe.
3º Módulo está reservado para as
quintas e sextas classes
Estes
três módulos são para a alfabetização e pós alfabetização
Em cooperação com CUBA, o Governo angolano lançou há 4 anos atrás a fase
piloto apenas em 2 bairros de Luanda, um método de alfabetização denominado
“sim, eu posso” através da combinação de cartilhas (uma para o educador e
outra do aluno) e vídeo aulas. Mas os vídeos aulas são quase inaplicáveis
devido à falta de energia elétrica que é um problema grande em Angola. Essa
metodologia Cubana, que está na fase de tentativa de adaptação em Angola, é
composto por três etapas:
·
A primeira de treinamento (dez aulas),
·
A segunda de ensino da escrita e leitura (42 aulas)
·
A terceira de consolidação (11 lições).
·
A maior dificuldade é a
qualidade e quantidade de professores alfabetizadores. Neste momento existem
alfabetizadores aproximadamente 25.000 em todo território nacional para atender
uma demanda de mais de 11 milhões de pessoas analfabetas que querem estudar.
Assim, tem havido uma rede de voluntários que recebem um subsídio mensal de aproximadamente
200 USD, como contribuição dos alfabetizando. Não existe praticamente
infraestruturas escolares especificamente destinadas para alfabetização. Não
existe materiais didácticos em quantidade e em qualidade bem como outros meios
de apoio pedagógico. A geografia humana de Angola é dispersa, sem vias de
acesso, e a alfabetização apenas ocorre nos centros de municípios e províncias.
As zonas mais afastadas das cidades possuem maior índice de analfabetos devido
ao difícil acesso. Existe várias etnias incluindo etnias minoritárias mas a
alfabetização não veicula qualquer valor étnico-cultural ou identidade socio
antropológica dos povos de Angola. A alfabetização em curso em Angola está
focalizada na aprendizagem da leitura, cálculo e escrita, de forma puramente
literária. Não existe qualquer iniciativa de aliar a alfabetização com a
cidadania, com a profissão, com a cultura, com outros tipos de nexos societais.
Pelo que a alfabetização está desgarrada, desligada do contexto em que ela
ocorre. Todas as iniciativas faltam metodologias activas, métodos mais
adaptados aos contextos sociais locais, falta o vínculo prático nesta teoria. A
falta de motivação e pouco interesse dos alunos deve-se do total desligamento
da alfabetização ao modo de vida de alunos e seus familiares, ou seja, a
linguagem veiculada nos programas de alfabetização é demasiado teórico,
codificada na leitura, calculo e escrita, e descontextualizada das necessidades
vitais das pessoas. Os conteúdos são ainda estranhos aos valos da comunidade
onde ela está a ser processada. Depois a cooperação com CUBA (Espanhol)
dificulta ao povo angolano que já tem imensas dificuldades em falar a língua
portuguesa devido a variedade etnolinguística dos alunos.
3.1.1-Proposta
pedagógica CAT (Conhecer, Analisar e Transformar) do FORDU
A
proposta pedagógica CAT sugere que o sistema de ensino deve fincar raízes no
Conhecer (conhecer o aluno, os familiares, os professores, a realidade onde a
escola se encontra, suas potencialidades e seus problemas) e a escola deve
parar vários momentos para Analisar (essa realidade da escola) e depois
aproveitar as potencialidades da escola, da cientificidade e dos alunos para
transformar a realidade em progresso. Significa que é a realidade da comunidade
onde a escola está, que fornece conteúdos didácticos à escola e esta deve
contribuir para melhorar o modo de vida da comunidade. Neste método CAT o FORDU
pretende:
·
Introduzir a alfabetização
na perspectiva profissionalizante
·
Os conteúdos deveriam ter o
caracter nacional e não oficial ou seja, que fosse um conteúdo que respeitasse
as especificidades étnicas, linguísticas, geográficas, profissionais
(camponeses, pescadores, caçadores, recolectores, comerciantes informais, pastores,
povos sedentários ou nómadas, etc).
·
A alfabetização enquadrada
na perspectiva de projecto educativo de escola para as próprias comunidades,
que estimulasse a auto-organização, melhoria de suas práticas económicas,
melhoria de sua visão de cidadania;
·
Que a alfabetização
englobasse a visão de publicidade das potencialidades culturais, turísticas,
artísticas locais para melhorar a autoestima dos camponeses e caçadores.
·
Que a alfabetização
veiculasse virtudes sociais como transparência, solidariedade, equidade,
respeito,
·
Finalmente, é uma
necessidade muito grande a criação de pequenas bibliotecas com livros usados
que se pode recolher em campanha de doações no estrangeiro como por exemplo no
Brasil e abrir pequenos Baús Pedagógicos de recursos para consultas, leituras,
clubes de aprendizagem de línguas, clubes de notícias (jornais e boletins
comunitários) para estimular a aprendizagem porque o conhecimento será aplicado
na vida concreta e não o universo teórico.
Apesar dessas linhas acima, as nossas necessidades serão bem definidas em
função do diagnóstico nas zonas que viermos a identificar como sendo zonas
estratégicas de intervenção.
3.2-Parceria
Escola-Comunidade
Para se cumprir cabalmente a
função social da escola, esta precisa envolver a comunidade. Precisa
estabelecer uma parceria Escola-Comunidade. Para se concretizar tal desiderato,
a escola precisa elaborar o Projecto Educativo de Escola.
3.2.1-Proposta Pedagógica P.E.E do FORDU
O Projecto Educativo de Escola P.E.E.
é o instrumento estratégico “que consagra a orientação educativa da escola,
elaborado e aprovado pelos seus órgãos de administração e gestão para um
horizonte de três anos, no qual se explicitam os princípios, os valores, as
metas e as estratégias segundo os quais a escola se propõe cumprir a sua função
educativa”
O PEE é, pois, a referência fundamental para a
afirmação da autonomia e para a permanente construção da identidade da escola.
Para tal pretende-se que a Escola pretenda que este instrumento orientador
congregasse toda a comunidade educativa numa dinâmica participada e apostada na
diversidade dos caminhos para o sucesso educativo
Não há qualidade na educação sem a
participação da sociedade na escola. A garantia de espaços de deliberação
colectiva está intrinsecamente ligada à melhoria da qualidade da educação e das
políticas educacionais. Só aprende quem participa ativamente no eu está
aprendendo. Se a qualidade de ensino não for abrangente a todos alunos, vai se
chamar qualidade para poucos. E sabemos que a qualidade para poucos não se
chama qualidade, mas sim privilégios. O contexto social é determinante na
qualidade de educação. Mas há também muito a fazer no interior das escolas. E
nisso somos todos os responsáveis. Os professores precisam ser bem formados,
bem pagos, para ensinar. Precisamos investir na discussão do currículo e das
metodologias.
PILARES
DO PEE:
A DEMOCRACIA
implica que, no respeito pela pluralidade de iniciativas e de opiniões, as
decisões / deliberações devem envolver a participação dos membros da comunidade
escolar e ser devidamente fundamentadas.
A AUTONOMIA
é a possibilidade da escola tomar decisões e criar dinâmicas por siprópria, em
termos educativos e organizacionais.
A DIVERSIDADE,
consagrando o direito à diferença e à pluralidade nos mais variados níveis -
cultura, pensamento, religião, pedagogia, expressão - enriquece a dinâmica da
escola.
A
COESÃO implica solidariedade e
dinâmica de integração, constituindo o elemento estabilizador da comunidade
escolar
3.3-Professores
e Formadores comprometidos com a qualidade da escola
A qualidade e compromisso do
professor é um instrumento viável de aprendizagem equilibrada e socialmente
comprometida com a realidade.
3.3.1-Proposta
Pedagógica P.C.E (Projecto Curricular de Escola) do FORDU
O
PROJECTO CURRICULAR DA ESCOLA.
No quadro do desenvolvimento da autonomia da escola, p PCE é um conjunto de
decisões e propostas de intervenção adequadas a um contexto específico,
articuladas com o currículo nacional, concebido, aprovado e avaliado pelos
respetivos órgãos de gestão da escola, incluindo o conjunto de recursos
didatico-pedagógicos que as equipas docentes
podem utilizar para elaborar seus projectos de turmas. O objectivo
central é seleccionar as técnicas, as taticas, as estratégias de gestão de
conteúdos que mais contribua para se alcançar os objectivos nucleares de
aprendizagem que a escola se propôs. O PCE é, assim, a base fundamental da aprendizagem. É com o
PCE que se deve determinar a estilo docente, a ordem dos seus conteúdos, o
cumprimento dos objectivos, a sua estrutura organizativa e de funcionamento, o
equilíbrio da sua avaliação e todos os elementos do projecto educativo em eu se
apostou. O desenvolvimento do «espírito
democrático pluralista, respeitador dos outros e das suas ideias, aberto ao
diálogo e à livre troca de opiniões», de modo a formar cidadãos «capazes de
julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de
se empenharem na sua transformação progressiva», contribui para «o desenvolvimento
pleno e harmonioso da personalidade dos indivíduos», incentivando-os a serem
«livres, responsáveis, autónomos e solidários». Isto se consegue através de
construção de um currículo progressista. O currículo escolar assume objectivos
que extravasam a dimensão cognitiva abarcada pelas tradicionais disciplinas e
contempla, com particular ênfase, a importância da consciencialização de
valores e do desenvolvimento de atitudes.
Para tal conta com alunos
participantes, criativos, curiosos, abertos a interdisciplinaridade e
disciplinados.
A proposta pedagógica jamais será
cabalmente realizada se não se contar com envolvimento da comunidade onde a
escola está inserida.
Depois
destes dois pilares: educativos –aluno e comunidade precisa-se um professor que
é líder de pessoas e líder de processos
3.3.2-Guias
metodológicas e seus conteúdos
Tanto a proposta pedagógica
CAT, o projecto de parceria escola-comunidade PEE, bem como a formação
permanente do professor através do Projecto Curricular de Escola PCE precisam materiais
didácticos adequado. E o FORDU se propõe a elaborar guias metodológicos
destinados aos professores e formadores
3.3.3-Onde queremos ir
AVALIAÇÃO
DO ALUNO, DO PROCESSO E DO CONTEUDO
Depois de cada uma dessas etapas, vem
a Avaliação que envolve 3 momentos importantes:
AUTO-AVALIAÇÃO-processada pelo próprio sobre seu
progresso na base de resultados e impacto
A
HÉTERO-AVALIAÇÃO-
processada pelos alunos, professores, direcção da escola e a comunidade
envolvente (esta é base de uma avaliação da verdadeira qualidade de educação)
AVALIAÇÃO DE CONTEÚDOS- processada numa
perspectiva clássica das disciplinas curriculares e eventualmente
extracurriculares.TUNIS (TUNÍSIA), FORUM SOCIAL MUNDIAL DE 2015
27 DE MARÇO DE 2015